Em 1962, quando tive o bom gosto e a felicidade de optar em torcer pelo Esporte Clube Bahia, o clube já tinha conquistado o título de campeão da então Taça Brasil de 1959, que na época, equivalia a um Campeonato Brasileiro. Mesmo ainda criança, lembro-me como se fosse hoje, aquele “amor à primeira vista”, numa bela tarde ensolarada de domingo, num jogo amistoso realizado na cidade de Serrinha, quando o Esquadrão de Aço venceu o selecionado local pelo placar de 1×0, gol marcado por Biriba. O futebol naquela época, de profissional, só tinha a denominação, presidentes se eternizavam no cargo por dez, quinze anos, como se fossem donos da agremiação. Uns, para satisfazer o próprio ego, pela ambição do poder que o conduzia à vitrine de um grande clube; outros, já vislumbravam maiores objetivos, preferencialmente, para iniciar uma carreira política, o que se tornava fácil, se o time correspondesse dentro das quatro linhas, principalmente, com a conquista de importantes títulos e, isso não só aconteceu com o saudoso Osório, mas, também, com outros ex-presidentes do Bahia.
No caso específico de Osório, antes dele ser presidente do Bahia, era um servidor público que exercia o cargo de Inspetor de Polícia e durante sua gestão no Bahia, foi deputado estadual, candidato a governador da Bahia e vereador de Salvador. Não sei se por meritocracia ou por absoluta falta de democracia na época, Osório presidiu o clube por 11 anos (1958-1969) e, mesmo com o expressivo título conquistado em 1959 e outras boas temporadas pós título, quero crer que tenha sido pela segunda alternativa, a verdade é que era uma época em que se praticava um futebol tão romântico e folclórico que o saudoso e carismático cartola se deu ao luxo de, quatro anos após deixar a presidência do clube, lançar seu polêmico livro “FUTEBOL: PAIXÃO & CATIMBA”, um “documentário” que registrou suas artimanhas e facetas nos bastidores do futebol.
Se Osório presidiu por mais de uma década, durante os anos 70, passaram seis presidentes pelo Bahia, com destaque (negativo) para o falastrão Alfredo Saad, um bem sucedido empresário que, durante seu mandato (1970-1971), “doou” um grande e valioso terreno ao clube para construção do seu estádio próprio e antes de encerrar seu mandato, ignorou a “doação” e acabou vendendo para construção de um grande shopping center. Já o destaque positivo vai para o ex-presidente Fernando Schmidt que tomou posse em 1975 como tri-campeão e deixou o cargo em 1979 após a conquista do Hepta, além de ter vendido o passe do atacante Jorge Campos por uma batelada de cruzeiros – para os mais jovens, não se trata de “navios” e sim, da moeda (Cr$), vigente na época no Brasil -, dinheiro que foi fundamental para aquisição do terreno onde foi construído o Fazendão, um ativo que abrigou por quarenta anos, toda estrutura administrativa e operacional do clube.
Durante todo seu mandato, o então presidente Fernando Schmidt teve Paulo Maracajá como seu diretor de futebol, que acabou sendo seu sucessor, cuja gestão, se estendeu de 1979 até 1994. Então, se alguém achou um exagero Osório comandar o Bahia por longos onze anos, Paulo Maracajá mandou e desmandou por quinze anos, dando sequência a boa gestão de Fernando Schmidt, mas, com o plus da conquista do Bi-Campeonato Brasileiro de 1988 diante do Internacional, em pleno estádio do Beira-rio, título que paralisou Salvador por quase uma semana. Em contrapartida, acho que Maracajá se empolgou muito com aquela conquista e acabou se esquecendo de potencializá-la à exaustão, quando deveria ter colocado o marketing do clube em ação no sentido de mobilizar torcida e patrocinadores para captar recursos que seriam direcionados ao fortalecimento de Passivos e Ativos da instituição, afinal de contas, foi um título de âmbito nacional que tem clube lutando, há mais de cem anos, para conquistá-lo.
Para não fugir à regra, assim como fez Osório, tanto Fernando Schmidt como Paulo Maracajá, resolveram enveredar pelos caminhos da política. Schmidt, após ter exercido o mandato, foi eleito Vereador, enquanto que Paulo Maracajá, foi vereador e, posteriormente, Deputado Estadual. Vale salientar que na época, o presidente era um abnegado do clube e não recebia salário, podendo exercer outras funções fora do clube, inclusive, cargos eletivos e boa parte da gestão de Paulo Maracajá no Esquadrão de Aço foi exercida, simultaneamente, com os cargos eletivos que ele ocupara na política, só sendo impedido de continuar presidindo o Bahia quando foi nomeado pelo governo do estado para assumir o cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios.
Oficialmente, o “império” de Maracajá no Bahia se encerrou em 1994 com sua ida para o TCM, porque o Tribunal não permitia o acúmulo de funções. Só que, o próprio Paulo sempre dizia que na medida do possível, continuava colaborando e ajudando seu clube de coração, mas, na minha imaginação, pela liderança, carisma e prestígio que ele sempre desfrutou na Instituição, mais do que colaborar e ajudar, mesmo agindo na “clandestinidade” do poder, ele apitou e decidiu, juntamente com alguns presidentes que o sucederam, intercedendo nas administrações de Francisco Pernet, Antônio Pithon e Marcelo Guimarães [Pai], rompendo o relacionamento com esse último, ainda durante à sua primeira gestão se afastando, definitivamente, de qualquer ação nos bastidores do clube.
Àquela altura do campeonato, quando aconteceu o rompimento entre o presidente de fato, Paulo Maracajá e o presidente de direito, Marcelo Guimarães, o time já vinha “descendo à ladeira”. Já tinha sido rebaixado em 1997, só voltando à disputar a Série A em 2000, graças a uma virada de mesa da CBF em 1999 que de uma canetada só, o então presidente da CBF Ricardo Teixeira, determinou o retorno à Série A, não só do Bahia que estava na Série B, como do Fluminense/RJ que já havia descambado para Série C, sem esquecer que nesse mesmo ano de 1999 aconteceu aquela presepada na final do Campeonato Baiano, quando o BAVI estava programado para o estádio Manoel Barradas e o tricolor usou o “álibi” de se apresentar na Fonte Nova e o final daquele triste episódio, todo mundo se recorda, no que deu sendo que, tudo aquilo aconteceu durante à (di)gestão de Marcelo (Pai).
Para não pensarem que só sei censurar a gestão do Marcelo [pai], faço o registro da conquista do Bi-Campeonato da Copa do Nordeste 2001/2002. Em contrapartida, foi o responsável pela irresponsabilidade do Bahia ser recordista de rebaixamentos (quatro) no decorrer de sua ou, de suas gestões. Mas, como a Lei Espiritual de Causas e Efeitos não costuma “faiar”, lembram como foi conseguido o “acesso” à Série A de 2000? “Natoramente”! E naquele mesmo ano do Bi-Campeonato da Copa NE, o Bahia ficou na bica de cair para Série B, só se livrando do rebaixamento, na última rodada ao vencer a Portuguesa de Desportos por 4×2 no estádio do Canindé e, já em 2003 a aludida “Lei” veio a galope e houve mais um rebaixamento e este, veio para valer, aconteceu em séries: Série B: 2004/2005; Série C: 2006/2007 e novamente Série B de 2008 à 2010. resumo da ópera: sete anos consecutivos integrando as divisões inferiores do futebol brasileiro.
Vale ressaltar que Marcelo [Pai] iniciou sua gestão com o clube na Série A e em 2005 o entregou a seu sucessor Petrônio Barradas, já na Série B e, despencando para Série C, presságio que foi configurado na última rodada da competição quando o Bahia foi derrotado por 3×2 pelo Paulista, numa sombria tarde de sábado no estádio Jayme Cintra, em Jundiaí, uma derrota que marcou o maior vexame , um baque sem precedentes em toda história do clube, ao ser rebaixado à Série C, até então, atingindo o ápice do seu inferno astral vivido na década de 2000, a pior década do Esquadrão de Aço.
Se um clube da grandeza e expressão do Esporte Clube Bahia já é difícil de ser administrado na Série B, imaginemos a “bucha de sena” que a instituição se transformou jogando uma Série C? E justiça seja feita, ao então presidente Petrônio Barradas que, sem dinheiro em caixa, sem cotas de TV, sem fortes patrocinadores, apenas, com o apoio “crítico” do torcedor no estádio, carregou o “piano” por dois anos naquela famigerada Divisão, conseguindo o acesso à Série B em 2007, primeiramente, vencendo um jogo dramático, verdadeiro teste para cardíaco, aquele jogo Bahia 1×0 Fast de Manaus, só definido aos 51 minutos do segundo tempo, colocando o tricolor no octogonal da decisão, eliminando o Crac de Goiás e, posteriormente, empatando em 0x0 com o Vila Nova, carimbando o acesso à Série B, com o torcedor num misto de alegria e tristeza, por um lado, comemorando o tão sonhado e suado acesso e, por outro lado, lamentando a morte de sete torcedores que caíram de uma altura de vinte metros, após o rompimento da arquibancada da antiga Fonte Nova.
Esse foi o fim do calvário do Bahia na Série C, festejado com muita cerveja, mas, também, refletido com muitas lágrimas derramadas, uma verdadeira saga, aliada a luta titânica do presidente Petrônio Barradas que após dar murro em ponta de faca, por dois anos, conseguiu livrar o clube daquela sarjeta denominada Série C, permaneceu presidindo o clube até o final de 2008 e quando o torcedor tricolor imaginava que o Clube modificasse seu modelo de gestão, é sucedido por Marcelo [Filho] que assumiu o cargo com o clube na Série B, no mesmo patamar que Marcelo [Pai] deixou em 2005.
Quem acompanhou a fracassada gestão de Marcelo [Pai], jamais imaginaria que, o mandato exercido pelo seu sucessor, Petrônio Barradas serviu, apenas, como um hiato administrativo para disfarçar o continuísmo que a dinastia dos Guimarães tentou implantar na instituição, cuja gestão, seria o modelo “de pai para filho” e vice-versa. Esse modelo de gestão era tão paradoxal que, enquanto os presidentes anteriores se beneficiaram do cargo para extrair dividendos eleitorais do torcedor para pavimentar suas carreiras políticas, com o pai e o filho, foi diferente: eles assumiram a presidência do clube com mandatos de deputado e com os desgastes sofridos pelas más gestões no clube, não se reelegeram, após deixarem o clube.
E por falar em paradoxos, um dos primeiros atos de Marcelo [Filho], foi a contratação de um rubro-negro de quatro costados para gerir o departamento de futebol do clube, ato que rendeu ao então presidente, “pagar o maior mico” de sua conturbada gestão. Quanto ao que aconteceu de positivo na referida gestão, o próprio gestor sempre alardeou a construção da “Cidade Tricolor” um patrimônio, fruto de uma permuta envolvendo o Fazendão, imbróglio que, em função de demandas judiciais, passou seis anos sem ser utilizado, deteriorando-se e, graças a atual gestão, após muitos embates jurídicos e o desembolso de vultosa quantia, o empreendimento foi viabilizado, consolidado e inaugurado.
E , entre tapas e beijos, seguia a dinastia dos Guimarães, com Marcelo (Filho), já no seu segundo mandato e faltando um ano e meio para concluir, aconteceu àquelas duas acachapantes goleadas na Arena Fonte Nova diante do nosso arquirrival, derrotas que mexeram com o brio e sentimento do torcedor e indignaram os poucos conselheiros que formavam um pequeno grupo de oposição à dinastia que imperava na instituição, muito diferente da grande maioria do Conselho, constituído pelas “Vacas de Presépio” que sempre diziam “amém”, não só para eleger presidentes através de eleições indiretas como para referendar decisões que nem sempre favoreciam aos interesses do clube. Mas, como diz a velha máxima que “há males que vem pra o bem”, mas, no caso das referidas goleadas, faço uma paródia com a tal máxima, afirmando que: “há malas que vem para o trem”! Por que?
Porque foi Graças as “desgraças” provocadas pelas duas humilhantes goleadas, que o torcedor se incomodou e, graças a Deus, um conselheiro se movimentou e resolveu ressuscitar um clube gigante que já se encontrava em estado de gigantismo e, “graças” aquelas humilhações sofridas, um determinado conselheiro conseguiu mover uma ação na justiça civil que culminou com a deposição do presidente do cargo, o clube passou por um processo de intervenção judicial, comandada pelo interventor Carlos Rátis que conduziu a eleição de um presidente-tampão para concluir o mandato do quem foi destituído do cargo, missão que coube a Fernando Shimidth que, infelizmente, não evitou o rebaixamento do clube em 2014, mas, o clube se democratizou e se modernizou com a criação das eleições diretas, colocando um ponto final no continuísmo, dinastias, oligarquias e todos os sistemas e modelos sórdidos de gestões que tanto prejudicaram à Instituição Esporte Clube Bahia no decorrer da sua gloriosa história.
Após tantos engôdos e transtornos de gestões, o clube entrou na era das eleições Diretas e, por mera coincidência, teve um Marcelo como seu primeiro presidente eleito, democraticamente, mas, já sem o amém vindo do “curral das vacas de presépio”. Trata-se do jovem Marcelo Sant’Ana, na minha opinião, um jornalista por vocação, mas, um presidente com pouca aptidão que o cargo requer, entretanto, um cidadão inteligente e dedicado que além de conseguir o acesso em 2016, voltou a ser campeão da Copa do NE em 2017, acabou fazendo uma boa gestão no clube, mas, longe de ter sido brilhante.
Sucessor de Marcelo Sant’Ana e atual presidente, Guilherme Bellintani é torcedor nato do Bahia, empresário bem sucedido do setor de ensino privado. Antes de concorrer às eleições do clube, ocupou relevantes cargos públicos na administração municipal, os quais, exerceu com tanta desenvoltura que o governador da Bahia que cooptou e o convidou para concorrer à sucessão municipal e ter o seu apoio, graças a Deus, o convite não foi aceito, preferindo continuar presidindo o Bahia e realizando uma excelente gestão onde tem se destacado no cenário nacional, como grande líder de grupos de clubes integrantes da Série A que negociam seus pleitos junto à CBF e emissoras de TV. Embora haja cobrança de muitos torcedores pela conquista de um título expressivo, a maioria da torcida aprova e confia em sua equilibrada e dinâmica gestão e, se os resultados desejados pelo torcedor dentro de campo, ainda não aconteceram, mais cedo ou mais tarde, tendem a acontecer, porque, o trabalho está sendo feito e, muito bem feito.
José Antônio Reis, torcedor do Bahia e colaborador do Futebol Bahiano.