O importante é competir?

Em 2009, se alguém falasse mal da Olimpíada do Rio 2016, com certeza, eu debateria. O evento tinha tudo para ser o mote ideal para implementar diversas ações nas áreas de segurança, saúde, ambiental, e, principalmente, esportiva. Porém, com a Olimpíada já batendo à nossa porta, o cenário é completamente diferente do imaginado, pelo pior dos pessimistas, há sete anos.

Uma crise política absurda, com a presidente da República afastada por um impeachment. O governador do Rio decreta estado de calamidade pública há menos de dois meses do início da competição. Ameaças de atentados, violência incontrolável, desemprego, crise econômica e obras ainda não acabadas para o início das provas. Com todo esse cenário desfavorável, atrelado a falta de apoio ao esporte olímpico, só podemos lembrar das palavras de Pierre de Frédy: “o importante é competir”.

Mas competir é a realidade dos nossos atletas. Eles ficam ano após ano buscando apoio e ouvindo desculpas de empresários. Lutam diariamente para conseguir patrocínios dignos, mesmo com resultados expressivos já alcançados, mas não conseguem. Esses atletas merecem ainda mais o nosso respeito. Irão representar em agosto uma nação em frangalhos. Vão nadar, pedalar, lutar, saltar, se equilibrar, jogar, atirar (em competições esportivas, não em morros) e todos terão um único espírito. Fazer o seu melhor para conseguir a medalha olímpica. Alguns ainda conseguirão algo maior e irão escutar, sob lágrimas e orgulho do povo brasileiro, o hino nacional sendo tocado e a bandeira verde e amarela subindo mais alto que as outras. Esses serão tratados como heróis nacionais. 

Nos próximos três ou quatro meses, a imprensa dará destaque especial a esses atletas. Os medalhistas olímpico aparecerão nos programas de TV, falarão do orgulho de defender o seu país, do esforço dedicado até o momento épico nos Jogos e terão seus minutos de fama e glória, merecidos. Terão audiência com políticos, ganharão placas em suas cidades, desfile em carros de bombeiros. Uma festa. 

Os outros, que não conseguiram o pódio, continuarão  na luta por patrocínios, nas pedaladas pelo equilíbrio financeiro, no triatlo do amadorismo trabalho-treino-casa, nas corridas atrás de ônibus, enfrentando dificuldades de todas as ordens. Vencedores e competidores só se juntarão novamente em janeiro, quando a sombra do anonimato voltará a recair sobre ambos e começarão os trabalhos pelo sonho de Tóquio-2020. Exceto os do futebol, pois esses continuarão em evidencia. 

E eis que surge a pergunta mais valiosa que a medalha de ouro: por que fazemos isso com nossos atletas? Um dado muito interessante do Ministério dos Esportes pode ser a resposta para isso. “Ao longo da última década, o Ministério do Esporte concedeu mais de 43 mil bolsas para cerca de 17 mil atletas brasileiros, com investimentos que ultrapassam R$ 600 milhões”. Fazendo umas contas rápidas descobrimos que o programa destinou mensalmente, em média, R$ 294,12 para cada um dos 17 mil atletas contemplados. Além do Bolsa Atleta, o governo investiu R$ 2,5 bi no ciclo olímpico, de 2012 a 2016, por meio de empresas como a Caixa Econômica Federal, o Banco do Brasil e os Correios.

E onde estarão os empresários que poderiam patrocinar esses atletas? Como se sentem vendo atletas promissores desistindo do esporte por falta de patrocínio? Ou mesmo assistindo o Brasil ficar atrás de países como Cazaquistão, Cuba, Irã, Coreia do Norte, República Tcheca e Jamaica no quadro de medalha, como aconteceu em Londres-2012? 

Além do patrocínio e do incentivo, falta respeito aos atletas nacionais. Aos que vencem, aplausos. Aos que perdem, ainda ouviremos: “treinam tanto para errar na ‘hora h’”. Mas se nem ‘a bola não entra por acaso’, como alega Ferran Soriano, essas pessoas nem imaginam o quanto é preciso para ganhar uma medalha olímpica.

* Erick Cerqueira é publicitário e pós-graduando em Gestão Esportiva

Texto publicado no Correio da Bahia, versões impressa e digital, dia 18 de julho de 2016

Autor(a)

Redação Futebol Bahiano

Contato: futebolbahiano2007@gmail.com

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