“Impossível pensar no Vitória grande enterrando o Bahia”

Inicialmente desacreditado, visto como o homem do continuísmo, chamado do velho de bengala e até representante do atraso (confesso e retiro) o presidente Raimundo Viana, do Esporte Clube Vitória calou a boca de meio-mundo, só não calou o meu amigo Atahualpa que acreditou no trabalho do veterano dirigente rubro-negro desde 31 março, data que assumiu o posto deixado pela renúncia de Carlos Falcão. 

O homem fez a correções adequadas no tempo certo e exato, e foi além, quando participou ativamente da campanha da Série B se debruçando diante dela, lhe oferecendo suporte e prioridade máxima, já como profundo conhecedor da história do clube, sabia que chegar ao objetivo da Série A, era talvez o único anseio do torcedor do Vitória. Moral: é o velho mundico nas cabeças, é o Vitória da Série A, confirmando uma frase do amigo Dinensen que acredita que o bom de ser velho, é saber tudo ou não desconhecer absolutamente nada.

Homem foi entrevistado pelo Jornal A TARDE, na Toca do Leão, onde fala sobre as críticas que sofreu, fala de bastidores de sua gestão e despista sobre a possibilidade de se candidatar à reeleição, no pleito previsto para dezembro de 2016, diz até que falou experiência ao presidente do Bahia.

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Você assumiu o Vitória com o cenário devastado e vindo da perda de tudo o que disputou: Campeonato Baiano, campeonatos de base, rebaixado à Série B… Em que momento o senhor sentiu que estava virando o jogo a seu favor?

Eu sempre fui vitorioso em tudo o que me meti. Na gestão pública, no ramo do direito (Viana é advogado), quando fui presidente do Vitória lá atrás (1972), quando fui presidente da Federação Bahiana de Futebol, da Federação Baiana de Remo… Então, pensei: “Será que, nesta etapa da minha vida, Deus me deu uma tarefa para que eu saísse como perdedor? Seguramente não!”. E Deus colocou no meu caminho pessoas com as quais eu não tinha muito contato, mas que foram fundamentais para a nossa vitória, como Manoel Matos, vice-presidente. E mais: quando disse naquela entrevista ao A TARDE (em abril) que eu era um presidente de vestiário, me criticaram. Mas o Falcão não foi de vestiário e se arrebentou. Fernando Carvalho, ex-presidente do Inter, disse num livro que infeliz é o presidente que não tem contato com seu povo. E o povo de um presidente de clube de futebol são os funcionários e jogadores.

A consequência veio na festa do acesso, quando os jogadores te jogaram para o alto, gritando “Vovô Mundico”?

Pois é. Não foi nada orquestrado. Na Conquista da Copa do Nordeste sub-20, foi a mesma coisa. Rapaz, essa história de ‘Vovô Mundico’ virou favoravelmente a mim. É um negócio fantástico, está no país inteiro. Uma vez, um repórter do Rio de Janeiro veio me perguntar sobre isso. Outra vez, fui à Toca da Raposa, do Cruzeiro, encontrei com Marquinhos (atacante, ex-Vitória) que falou: “Presidente Mundico, que bom te encontrar por aqui”. Até meus netos me chamam agora de ‘Vovô Mundico’. Só o que me incomoda é a ofensa. Infelizmente, eu recebi algumas.

Em algumas oportunidades, o presidente Marcelo Sant’Ana, do Bahia, disse que o único grande clube do estado era o Bahia. Como é sua relação com ele?

Gosto do Marcelo. É uma relação muito boa. Estive com ele há cinco dias, no arbitral do Campeonato Baiano, e lhe disse que seu momento não era bom, mas não havia razão para abaixar a cabeça. Quantos times não conseguiram subir? O Náutico não conseguiu, o Bragantino não conseguiu, o Paysandu não conseguiu… Ah, mas o Vitória conseguiu! Isso é um problema só da rivalidade. Ele é um grande presidente, eu só questiono um pouco querer exigir de um camarada que assumiu o clube há menos de um ano já dar resultados. É difícil!

Faltou experiência a ele?

Sim. Eu sempre disse que não era possível você crescer no meio de pigmeus. É preciso ter uma visão mais arrojada. Só se consegue ser grande no meio de grandes. Não dá para pensar num Vitória grande querendo enterrar o Bahia. Nunca valeu a pena. Eu sempre tive vontade de ser pelo menos igual à dupla Gre-Nal. São dois grandes. Um buscou um título mundial, o outro veio buscar depois. Ou à dupla Cruzeiro e Atlético-MG. Um fez a Toca da Raposa, o outro não sossegou até fazer a Cidade do Galo. Então, isso é resultado de uma rivalidade sadia. Já aqui na Bahia é um querendo diminuir o outro.

Você tem a característica de delegar, mas também tem tomado à frente em algumas decisões, sobretudo no futebol. Quais as contratações de 2015 em que você interferiu?

Todas passaram pela minha aprovação. Já conhecia o Pedro Ken, da primeira passagem dele pelo Vitória. Diego Renan eu conhecia do Vasco do Gama… E por aí vai. Foi muito difícil contratar, até porque andavam espalhando a história de que minha gestão não duraria 15 dias e meu sucessor não honraria nenhum compromisso que eu assumisse. Que jogador ia querer vir para um clube assim? Outro processo em nossa gestão que deu certo foram as dispensas. Eu fui indicando quem deveria sair. Por exemplo, o Kadu era de fato um bom zagueiro. Mas, de 10 partidas, ele perdeu 11. É no mínimo um camarada azarento! Aí vieram outras tentativas de contratação. Estávamos negociando com o zagueiro Antônio Carlos (ex-São Paulo e Botafogo), e o Vitória era a quinta opção dele. Ah, vá para o Diabo! Ou o Vitória é a primeira ou então esquece! Depois, teve aquele atacante do Grêmio, Kleber, que tem lá aquele apelido, como é? Trombador, sei lá… Ah, Gladiador! É um grande jogador, mas, para vir para o Vitória, saiu exigindo: “quero isso, quero aquilo…”. Esquece, vamos atrás de outro!

A chave do sucesso foi acertar contratações e dispensas?

Além de dar sorte nas contratações, minha grande virtude foi a recuperação de outros atletas. Exemplo: Rhayner. Ele não servia para ninguém. Vander também. Elton diziam que parecia um sonâmbulo, mas o problema é que eles não tinham horizonte. E o pior de tudo é que nada dava certo para a gente. Jogamos uma partida com o Paysandu, em Belém (em 23 de junho, pela 9ª rodada da Série B). Metemos três bolas na trave e levamos 1 a 0 no último lance do jogo, num chute que bateu no Ednei e entrou no gol. Ôh, zagueiro azarado! O que eu fiz? Chamei o padre, mandei rezar uma missa e sair benzendo tudo na Toca do Leão. Na missa, eu, quase chorando, pedi ao padre para assumir um compromisso no dia 30 de novembro: rezar uma nova missa celebrando a volta do Vitória para a Série A. Teve amigo meu que riu na hora e disse: “o sol está muito quente e derreteu a moleira do cara”. Para quem duvidou, a missa foi celebrada.

Projetando 2016, o Vitória está com caixa para montar um time forte para a Série A?

Time forte é time comprometido. Uma das coisas que mais me emocionou foi ver que, na hora dos gols do Vitória, os atletas do banco de reservas eram os primeiros a correr desesperadamente para abraçar o goleador. No vestiário, era a mesma alegria contagiante. Falavam do Kanu, que era um beberrão e que não jogava nada. E ele provou que era um excelente jogador, muito comprometido. Ao lado dele na zaga, joga o Ramon, uma de nossas grandes revelações. Tem tudo para ser o novo David Luiz. Para o ano, vai ser esta a base do nosso plantel.

O Vitória vive uma situação financeira boa que permite contratar reforços?

Na situação atual do país, não dá para dizer que estamos numa situação financeira boa. Mas dá para tanger. O Vitória cumpriu todos os compromissos que assumiu em 2015. E não há a menor dúvida que precisamos de reforços, como um lateral, um meia e um atacante de beirada.

Você é favorável à eleição direta? Sairá candidato em 2016?

Falta um ano, é lá na frente ainda… Eu já disse que eu sou a favor da eleição direta, mas não acho que isso seja causa suficiente de sucesso. Veja o Bahia, que tem eleição direta e está na Segunda Divisão. Se voto direto fosse causa de sucesso, o Brasil seria o melhor país do mundo. Quando eu vejo senador preso e outros caminhando para a prisão, me dá uma tristeza enorme.

Como você lida com a oposição no Vitória?

Natural. Oposição é saudável, e minha gestão parece que está aprovada. Subimos para a Primeira Divisão e ganhamos tudo na base (Baiano sub-15, sub-17 e sub-20, Copa do Nordeste sub-20 e Brasileiro sub-17). Recuperamos a auto-estima dos jogadores. Avançamos no patrimônio: estamos completando os três campos de cima da Toca do Leão, que passará a ter seis campos. Nossa concentração passou por um upgrade grande. O Vitória avança a passos largos para transformar o Barradão numa arena. O projeto já está quase pronto. Em outros esportes, fizemos uma parceira para ter um time como protagonista do basquete brasileiro, no NBB. Vamos supor que daqui a um ano eu saia do clube, que eu não seja candidato, e quem entre no meu lugar seja alguém com quem eu não tenha afinidade. Vou deixar de ter voz no clube? Não! Por fim, repito: sou a favor da eleição direta, mas o que faz ganhar eleição não é o formato dela. É gestão séria e competente.

Autor(a)

Dalmo Carrera

Fundador e administrador do Futebol Bahiano. Contato: dalmocarrera@live.com

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