Vai respingar nas quatro linhas

Como vocês sabem, o banqueiro Daniel Dantas, que tudo vê e tudo provê, foi preso na terça-feira (solto na quarta e preso novamente nesta quinta-feira, 10/07) pela Polícia Federal. Além de gostar de ver tubarão na cadeia, escrevo sobre o tema porque há sinais de que a história não vai parar por aí – vai sobrar também para o mundo do futebol.

“Segundo o autor do furo sobre a prisão do banqueiro, o jornalista Bob Fernandes, do Terra Magazine, as próximas horas deverão trazer novidades sobre o submundo do futebol”, disse Juca Kfouri, no seu blog.

Além disso, de acordo o Estadão, o delegado que comandou a operação, PROTÓGENES Queiroz, é o mesmo que coordenou as investigações do caso Corinthians/MSI, por evasão de divisas e lavagem de dinheiro. A mesma notícia dá conta que o delegado esteve envolvido na investigação da “máfia do apito” em 2005 (historinha mal contada, essa).

E não só por isso. Todo mundo sabe que Dantas comandou a primeira e pior experiência de clube empresa no Brasil, quando o seu banco, o Opportunity, passou a controlar parte do Esporte Clube Bahia, de sua terra natal.

Para relembrar o caso, vão abaixo trechos de uma reportagem da revista Carta Capital, de 2004, intitulada “Dantas na Terceirona”.

Campeão brasileiro de 1988, detentor das maiores médias de público nos estádios na primeira metade desta década, o Bahia está mergulhado na pior crise de sua história. Rebaixado à Terceira Divisão do Campeonato Nacional, sem levantar uma taça há três anos, o time acumula dívidas de quase R$ 50 milhões. Os salários dos funcionários estão atrasados desde julho e o departamento de futebol, na falta de alternativa, deu férias de 45 dias ao elenco de jogadores.

Enquanto a maioria da fanática torcida tricolor tenta entender o que está acontecendo, um grupo de sócios e torcedores do Bahia acredita ter encontrado o vilão dessa história. Ele mesmo, o banqueiro Daniel Dantas, chamado nos bastidores do clube de “cavaleiro das sombras”. Na quinta-feira 27, o grupo encaminhou ao Ministério Público Federal um pedido de abertura de ação civil pública para que os procuradores investiguem a lisura do contrato firmado em 1998 entre o Bahia e o Grupo Opportunity. Segundo a representação, o acordo significou “o desmonte, a destruição moral, patrimonial e esportiva” da agremiação.

A associação entre o Bahia e o Opportunity foi a primeira experiência de clube-empresa no País, possibilidade aberta pela Lei Zico, editada em 1993.

Em 1998, o tricolor baiano, como hoje, enfrentava uma situação financeira difícil. Devia R$ 6 milhões e, no ano anterior, havia sido rebaixado à Segunda Divisão do Campeonato Brasileiro. O acordo com Dantas foi saudado como a salvação da lavoura.

Para os autores da representação ao Ministério Público, diretores do Bahia à época, entre eles o ex-presidente Marcelo Guimarães, a pretexto de recuperar as finanças e levar o time de volta aos tempos de glória, entregaram o patrimônio do clube de mãos beijadas ao Opportunity. Uma das provas anexadas é a ata da assembléia que aprovou a associação, em 9 de janeiro de 1998.

Há realmente algo estranho no documento. Durante a assembléia, os defensores do acordo com o banco afirmaram que o único patrimônio a ser repassado para a nova empresa seria o elenco de jogadores, avaliado em R$ 12 milhões. A sede social, o estádio e outros imóveis não seriam incluídos no acordo. Prometeram também que a gestão do clube seria compartilhada. A companhia, que se chamaria Bahia S.A., seria administrada por um conselho formado por quatro integrantes indicados pelo clube, quatro pelo Opportunity e um representante escolhido “entre os notáveis da Bahia”. Citou-se até um nome, Antonio Carlos Magalhães Júnior, filho de ACM e tricolor fanático.

Em meio a promessas de grandes investimentos e sonhos de conquistas internacionais, os conselheiros aprovaram a associação por unanimidade. No fim da reunião, entoaram o hino do Bahia. A ata traz, porém, um adendo não discutido pelos presentes na reunião. Cinco itens, acrescentados após o encerramento do encontro, alteram de forma substancial vários dos pontos aprovados pelo conselho.

Na introdução do adendo, Marcelo Guimarães investe-se de poderes para alterar, “a qualquer momento”, os contratos com o Opportunity. O item C modifica a composição do conselho do Bahia S.A. Em vez de quatro, o Opportunity ganhou o direito de indicar cinco nomes. No item E, o clube compromete-se a arrendar por 25 anos ao banco o centro de treinamento e o estádio Pituaçu, caso o governo estadual aprovasse o arrendamento. São os mesmos imóveis que os defensores do contrato haviam jurado não fazer parte do acordo. Um mês depois, Guimarães fez valer os itens do adendo e assinou protocolo que ampliava os poderes do Opportunity.

Apesar de os documentos entregues aos promotores revelarem uma “esperteza”, mais uma, do Opportunity, é difícil definir se o banco de Dantas é mesmo vilão ou mais uma vítima da crise do Bahia. No fim dos anos 90, tal qual a bolha no setor de tecnologia, imaginou-se que seria possível ganhar dinheiro com futebol no Brasil. DD não foi o único a apostar nessa possibilidade. O Bank of America fechou parceria com o Vasco da Gama. Após torrar US$ 200 milhões, a instituição tirou o time de campo.

Dantas imaginava obter lucro administrando vários clubes ao mesmo tempo, mas seus planos foram frustrados quando a Lei Pelé, editada meses depois da associação com o Bahia, proibiu que um investidor controlasse mais de um time.

No início, a associação até funcionou. O Bahia foi tricampeão baiano. Por força de uma virada de mesa patrocinada pela Confederação Brasileira de Futebol, voltou à Primeira Divisão do Brasileiro em 2000, ao lado do Fluminense. Mas a maré mudou rapidamente. Em 2001, o time ganhou seu último título estadual. Os tricolores baianos tiveram de engolir um tricampeonato do arqui-rival Vitória. Em 2003, caiu novamente à Segunda Divisão. Neste ano, acompanhou o Vitória rumo à Terceira.

Dos R$ 48 milhões que o Bahia deve, R$ 15 milhões são compromissos com a Liga Futebol, empresa controlada pelo Opportunity. Outros R$ 25 milhões referem-se a impostos estaduais e federais. O clube deve R$ 8 milhões a funcionários e fornecedores privados.

Este é um post preliminar, para não deixar o assunto passar em branco. Comecei a ir atrás de fontes no início da manhã, quando vi a notícia das prisões. Mas blogueiros mais afoitos levantaram a lebre antes de nós. Ócios do amadorismo.

Voltaremos ao tema em outra ocasião.

Daniel Cassol

Autor(a)

Dalmo Carrera

Fundador e administrador do Futebol Bahiano. Contato: dalmocarrera@live.com

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